7.4.11

Sangue, suor e lágrimas



A Professora de Balé de 76 anos Dora de P. Soares  que dá aulas diárias a uma turma de mais de 60 alunas de todas as idades, usa o exemplo para explicar por que a dança clássica já não parece tão atrativa para as garotas quanto no passado. “A não ser que ela tenha uma vocação irresistível”, diz. Como teve Patrick Lorenzetti, de 16 anos, filho de um funcionário da escola. Ele começou a dançar ali, primeiro hip-hop, depois balé clássico, até ser convidado para fazer parte do elenco do Balé Teatro Guaíra. “Hoje ele tem contrato e ganha um salário, mas isso não é tão sedutor para uma menina de classe média alta”, analisa Dora.
Nas academias, não há escassez de meninas matriculadas. Pelo contrário. Mas quantas se tornam bailarinas de fato? Muito poucas. E isso não acontece porque a sociedade atual parece dar mais valor aos 15 minutos de fama de um Big Brother do que ao prestígio conquistado com sangue, suor e lágrimas por um bailarino.
Dançar exige não somente sacrifício, mas todo o tipo de aptidões, do imprescindível talento às formas físicas adequadas. Dora conta que, a cada mil garotas que passam pelo Studio D1, uma se destaca. “Tenho uma aluna de 12 anos com todas as qualidades para se tornar uma bailarina. E ela ainda conta com o apoio dos pais, o que é raro”, conta. Além do talento, condição primeira, para ter futuro como bailarino é preciso ser aplicado, disciplinado e, como se tudo isso não bastasse, ter um corpo esguio e longilíneo.
Há quem tenha se lembrado, ao ler estas linhas, do sofrimento vivenciado por Nina, protagonista de Natalie Portman no filme Cisne Negro, uma bailarina que enlouquece em seu desespero para desempenhar com perfeição tanto o Cisne Branco quanto seu duplo maligno.
Dora discorda de que a opressão sentida pela personagem faça parte do universo do balé. “Essa moça é um tratado de patologia: é anoréxica, esquizofrênica, se automutila, tem uma mãe opressora e um diretor abusado. Não seria bem-sucedida em profissão alguma”, opina.
Eleonora Greca concorda. “As dificuldades enfrentadas por um bailarino são as mesmas de qualquer profissão”, diz. Um bailarino enfrenta horas de prática, por vezes, engolindo a dor, em sua busca pela perfeição. “A dança é como um esporte de ponta. Só não ganha em nível de exigência da ginástica rítmica e artística”, analisa Dora. “As escolas de dança são muito duras, e isso é necessário, pois não vai persistir quem não tiver autodisciplina. Quantas vezes um bailarino dança machucado e precisa estar firme?”, diz Eleonora.
As academias, na opinião de Eleonora, deveriam realizar uma avaliação prévia para verificar o perfil dos possíveis alunos e fazer com que os pais sejam corresponsáveis. “Eles não podem querer ser mais que os filhos. Às vezes, a família impõe a dança, e ela se torna um fardo grande para a criança, assim como é muito comum ver pais médicos ou advogados que querem que os filhos sigam sua profissão”, analisa. Para a bailarina, também falta um olhar mais atento do professor para o aluno especial e vocacionado. 

Publicado em 02/04/2011 | Annalice Del Vecchio
Fonte: Gazeta do Povo - Caderno G

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